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sábado, 23 de junho de 2018

Barravento

Parti pro mundo enorme, precisava sobreviver
De guias, mokan, roupa alva,
Ser Yawo merece todo o cuidado
contra-egum e lenço branco no ori
Sou recém casada! "Cabeça baixa, olhos no chão 
Silêncio, mantenha a calma interior. "
Repetindo o mantra
Fui comprar uma rosa branca
Mas em troca de uma benção
a ganhei do vendedor.
Por cada rua que passava,
querendo que chegasse logo minha casa
uma legião de olhos me acompanhava.
Curiosidade, espanto, admiração
Nenhuma dessas emoções me incomodava
Mas quando senti a tal intolerância na pele
Não consegui ignorar, não.
Esperando o ônibus, deu meio-dia
E fui correndo pra debaixo de uma sombra pedir agô
Ali concentrada, me sentindo mareada
Chegou perto de mim um tal senhor.
Entre berros e palavrões, dizia que Jesus me amava
Falava sobre o sangue de Cristo, que expulsava as mazelas
Enquanto me xingava. [Todos passavam e ninguém fazia nada]
Ali parada, perdida entre a vontade de sair correndo e chorar
Pensei ser prova necessária pra alguém que acabou de iniciar.
"Qual o problema, que ninguém diz a esse homem pra parar?
Não foi Jesus mesmo quem disse que nós devemos nos amar?" Olhei pra minha rosa, e lembrei do mensageiro Verger
disse que minha religião sobrevive
Porque não impõe verdade absoluta
a ninguém que não queira ver!
Meus ancestrais não impuseram
e sob as chibatas, sobreviveram firmes.
Deixemos as pessoas serem felizes
serem livres!
Permanecendo calada e triunfante
Por ter vencido aquele sentimento ruim
Veio alguém pra me ajudar
E tirou o homem de perto de mim.
Esse último, na despedida
Disse que a palavra de Deus salvava sim (como quem pudesse me converter)
E que com o comportamento do meu opressor
não tinha nada a ver. "Respeito sua fé, moço,
todos podem acreditar - ou não - no que for.
Mas já está na hora de tirar preconceito - e o desrespeito - do caminho
que eu quero passar com a minha flor."
.
Asé ô 🙏
Texto: Thais de Oyá - Barravento
📷: @olhardeumcipo
Via @filhosdocandomble
Foto de Puro Axé.

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